Kinshasa, 22 de agosto de 2025 – A República Democrática do Congo vive um dos momentos mais dramáticos de sua história política recente. O Ministério Público requisitou, nesta sexta-feira, a pena de morte contra o ex-presidente Joseph Kabila, acusado de crimes de guerra, traição e organização de movimento insurrecional. O julgamento decorre na Corte Militar de Kinshasa e acontece em contumácia, uma vez que Kabila não compareceu às audiências.
As Acusações
De acordo com a acusação, o antigo chefe de Estado teria mantido relações com o movimento rebelde M23, apoiado por Ruanda, e teria desempenhado papel ativo em práticas que envolvem homicídios, torturas, estupros e conspiração contra a segurança do Estado. Além da pena capital, o Ministério Público solicitou:
20 anos de prisão por apologia a crimes de guerra;
15 anos de prisão por conspiração.
A imunidade de que Kabila desfrutava como senador vitalício já havia sido levantada em maio, abrindo caminho para a responsabilização judicial.
Repercussões e Controvérsias
A decisão provocou fortes reações no cenário político congolês. Dirigentes do Partido do Povo para a Reconstrução e a Democracia (PPRD), fundado por Kabila, denunciaram uma clara manobra política. Ferdinand Kambere, um dos porta-vozes do partido, afirmou que se trata de “perseguição contra um opositor” e levantou dúvidas sobre a imparcialidade do processo.
Especialistas em segurança e analistas políticos também expressaram reservas. Henry-Pacifique Mayala, coordenador do Kivu Security Tracker, considerou os pedidos da acusação como “mais próximos de uma vendetta política do que de uma busca séria pela verdade judicial”.
Contexto Histórico
Joseph Kabila assumiu a presidência em 2001, após o assassinato de seu pai, Laurent-Désiré Kabila, e permaneceu no poder até 2019. Durante quase duas décadas de governo, consolidou-se como figura central da política congolesa, mas também foi alvo de denúncias de corrupção, repressão e desvio de fundos públicos, como revelado no escândalo “Congo Hold-Up”.
Em 2023, após um período de exílio, Kabila reapareceu em Goma, cidade então controlada pelo M23, fato que reforçou as acusações de cumplicidade com os rebeldes. Esse episódio é hoje um dos principais elementos utilizados pela acusação para fundamentar os crimes de traição e apoio a movimento insurrecional.
O Que Está em Jogo
Ainda não há data definida para o veredito. O desfecho do julgamento poderá marcar um ponto de viragem na justiça e na política congolesa, mas também pode aprofundar divisões num país historicamente fragilizado por conflitos armados e rivalidades políticas.
Se condenado à morte, Joseph Kabila será o primeiro ex-chefe de Estado da RDC a enfrentar tal sentença na era contemporânea. A comunidade internacional acompanha com atenção, enquanto setores da sociedade civil alertam para o risco de instrumentalização da justiça como arma política.